
Neste final de semana revi Fale com Ela (lírico e denso. A cena da tourada com a canção de Elis Regina é covardia de tão bonita) e Má Educação. Vida inteligente no cinema nos deixa um pouco mais inteligente também.
Crítica: Fale com Ela (Folha de SP)
A maturidade chegou para Pedro Almodóvar, mas não lhe roubou o senso de aventura. "Fale com Ela", que tem exibição neste sábado no Festival do Rio BR -e que virá também para a Mostra de Cinema São Paulo-, é um filme impregnado de segurança e serenidade, mas nem por isso sem inquietação. A trajetória de Almodóvar é a de um cineasta que, aos poucos, foi se despindo dos efeitos fáceis.
O jovem provocador de "A Lei do Desejo" e "Matador" não perdeu a rebeldia, apenas compreendeu que não há como se falar de amor sem buscar o mergulho no escuro. "Fale com Ela" é esse mergulho. Trata-se do ponto alto da fase madura de Almodóvar, inaugurada com "A Flor do Meu Segredo" (de 1995). É o mais bonito e o mais triste de todos os seus filmes, mais ainda do que "Tudo Sobre Minha Mãe", e é bem provável que não exista uma obra na história recente do cinema que tenha apresentado visão tão complexa e plural do amor.
Há, no filme, o amor devoto do enfermeiro Benigno (Javien Cámara) pela bailarina Alicia (Leonor Watling). Há o amor carnal (e não menos profundo) de Marco (Darío Grandinetti) pela toureira Lydia (Rosario Flores). E há o amor que nasce entre Benigno e Marco. Todos incondicionais.
Alicia e Lydia estão em coma. Benigno e Marco compartilham a dolorida experiência de amar corpos sem alma. Daí surge a incomum amizade entre os dois, uma vez que Benigno vai ensinar Marco a continuar amando Lydia, mesmo sem resposta. "Fale com ela" é um de seus conselhos.
O roteiro, sofisticadíssimo, se desenvolve em fios narrativos consistentes, cada um deles guiado por um personagem. A história revela um pouco da intimidade de Benigno e de sua obsessão por Alicia (que remonta ainda aos tempos em que ela era uma jovem e promissora bailarina, sob a tutela de uma professora interpretada por Geraldine Chaplin); depois revela como Marco conheceu Lydia. E, aos poucos, vai se costurando um bordado barroco, que culmina com a informação de que Alicia, mesmo em coma, está grávida. Mas Almodóvar já não cai mais nas armadilhas escandalosas de "Ata-me", por exemplo.
Cada fotograma de "Fale com Ela" traz a assinatura de Almodóvar, sem que o cineasta tenha se deixado levar pelo conforto da reputação de "grande autor". Mesmo retomando várias de suas obsessões (como a tourada, que já havia filmado tão bem em "Matador", ou a paixão pelos temas do melodrama), o diretor surpreende e parece se deixar surpreender.
"Fale com Ela" é, ainda, uma declaração de amor de Almodóvar a Caetano Veloso (que aparece cantando "Cucurrucucu Paloma"), a Tom Jobim (citado quase como um filósofo e presente na trilha com "Por Toda a Minha Vida", parceria com Vinicius na voz de Elis Regina) e à bailarina Pina Bausch, cujo espetáculo "Café Müller" abre o filme. E pode-se dizer, com serenidade, que Almodóvar chegou ao mesmo patamar desses três grandes artistas
O jovem provocador de "A Lei do Desejo" e "Matador" não perdeu a rebeldia, apenas compreendeu que não há como se falar de amor sem buscar o mergulho no escuro. "Fale com Ela" é esse mergulho. Trata-se do ponto alto da fase madura de Almodóvar, inaugurada com "A Flor do Meu Segredo" (de 1995). É o mais bonito e o mais triste de todos os seus filmes, mais ainda do que "Tudo Sobre Minha Mãe", e é bem provável que não exista uma obra na história recente do cinema que tenha apresentado visão tão complexa e plural do amor.
Há, no filme, o amor devoto do enfermeiro Benigno (Javien Cámara) pela bailarina Alicia (Leonor Watling). Há o amor carnal (e não menos profundo) de Marco (Darío Grandinetti) pela toureira Lydia (Rosario Flores). E há o amor que nasce entre Benigno e Marco. Todos incondicionais.
Alicia e Lydia estão em coma. Benigno e Marco compartilham a dolorida experiência de amar corpos sem alma. Daí surge a incomum amizade entre os dois, uma vez que Benigno vai ensinar Marco a continuar amando Lydia, mesmo sem resposta. "Fale com ela" é um de seus conselhos.
O roteiro, sofisticadíssimo, se desenvolve em fios narrativos consistentes, cada um deles guiado por um personagem. A história revela um pouco da intimidade de Benigno e de sua obsessão por Alicia (que remonta ainda aos tempos em que ela era uma jovem e promissora bailarina, sob a tutela de uma professora interpretada por Geraldine Chaplin); depois revela como Marco conheceu Lydia. E, aos poucos, vai se costurando um bordado barroco, que culmina com a informação de que Alicia, mesmo em coma, está grávida. Mas Almodóvar já não cai mais nas armadilhas escandalosas de "Ata-me", por exemplo.
Cada fotograma de "Fale com Ela" traz a assinatura de Almodóvar, sem que o cineasta tenha se deixado levar pelo conforto da reputação de "grande autor". Mesmo retomando várias de suas obsessões (como a tourada, que já havia filmado tão bem em "Matador", ou a paixão pelos temas do melodrama), o diretor surpreende e parece se deixar surpreender.
"Fale com Ela" é, ainda, uma declaração de amor de Almodóvar a Caetano Veloso (que aparece cantando "Cucurrucucu Paloma"), a Tom Jobim (citado quase como um filósofo e presente na trilha com "Por Toda a Minha Vida", parceria com Vinicius na voz de Elis Regina) e à bailarina Pina Bausch, cujo espetáculo "Café Müller" abre o filme. E pode-se dizer, com serenidade, que Almodóvar chegou ao mesmo patamar desses três grandes artistas
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