A literatura de Ana Miranda é de um primor e delicadeza extrema. Em sua solidão e distante dos grandes centros, a escritora realiza um mergulho sentimental na vida e obra de Gonçalves Dias. Seu romance Dias e Dias aborda de forma ficcionalizada aspectos da vida do autor romântico e conduz o leitor a ambientes especiais. Capítulos curtos, cada um com um título enxuga o discurso e dá a sensação de que estamos acompanhando um álbum de fotografias. O texto é narrado por Feliciana, uma moça apaixonadíssima pelo poeta e que tem como única sensação e destino da vida esperar o momento em que o poeta vai perceber que existe alguém que o ama com tanta intensidade. Ótimo.
Lembro-me de que era um belo dia de sol, cheio do burburinho popular, nas ruas atulhadas de veículos. Um dia bastante quente e de perfeita transparência. Do meu terraço via-se uma grande confusão de telhados, parques esparsos, um naco de baía juncado de mastros, a linha reta e cinzenta de uma avenida..... Por volta das onze horas caíram as primeiras fagulhas. Uma aqui, outra ali, partículas de cobre semelhantes às faíscas de um pavio; partículas de cobre incandescente que batiam no chão com um barulhinho de areia. O céu continuava límpido, o ruído urbano não diminuía. Só os pássaros da minha gaiola pararam de comer. (Leopoldo Lugones) A leitura desse texto de Lugones é sensacional. Impressiona pela beleza plástica e pela apoteose apresentada acerca do fim do mundo e a cena do fogo tomando conta, destruindo tudo em sua volta. Raridade. O texto está presente na coletânea dos "melhores contos bíblicos" da Ediouro.
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